A Câmara Municipal de Caxias (CMC) irá constituir uma comissão especial de vereadores para periodicamente avaliar o atendimento nas agências bancárias de Caxias em parceria com o Ministério Público Estadual, para que sejam tomadas as providências legais cabíveis no que tange à legislação em vigor, principalmente em relação a falhas que têm causado prejuízo à clientela que usa o serviço bancário na cidade. A medida foi anunciada na noite da última quinta-feira, 26, pelo presidente do legislativo caxiense, vereador Teódulo Damasceno de Aragão (PP), ao final da audiência pública solicitada pelo vereador Daniel Barros (PDT), realizada no plenário da casa, para tratar de assuntos relacionados ao atendimento no sistema bancário de Caxias.
A decisão nasceu após os vereadores constatarem que, das sete agências bancárias instaladas na cidade que foram convidadas (Banco do Brasil, Banco da Amazônia, Banco do Nordeste do Brasil, Banco SICOOB, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Santander), apenas duas, Banco do Brasil e Banco do Nordeste do Brasil, através dos gerentes James do Val Lima e Francisco de Assis S. Silva, respectivamente, compareceram ao encontro.
O presidente Teódulo Aragão considerou injustificável a ausência de uma representação da Caixa Econômica Federal (CEF), instituição pública sobre a qual pesa o maior número de reclamações em Caxias, enquanto outros vereadores, como Ricardo Rodrigues (PT) e Darlan Almeida (PL), apontaram o descaso também do Banco da Amazônia e do Bradesco, que nunca compareceram à sede do legislativo caxiense quando foram convidados a se manifestarem sobre o trabalho que realizam em Caxias. O vereador Torneirinho (PV) chegou a sugerir que os convidados faltosos sejam convocados a imediatamente prestar esclarecimentos e, em caso de desobediência, que o poder utilize suas prerrogativas constitucionais por via judicial.
Outra decisão emanada da audiência disse respeito a um levantamento que a assessoria jurídica da Câmara irá fazer para subsidiar os parlamentares com informações sobre a legislação municipal já aprovada em relação à pauta em discussão, a fim de que imediatamente sejam constituídas novas proposições que respaldem mais o interesse da população.
“Não iremos ficar parados, assistindo coisas erradas acontecerem porque os bancos se acham fortes. Dependendo do caso, vamos aplicar a lei e estabelecer judicialmente multas, para que o direito de nossos consumidores sejam respeitados”, disse o vereador Torneirinho. Já o vereador Daniel Barros, além de ratificar a fala do colega, se colocou à disposição da bancada para apresentar os projetos de lei que forem necessários para melhorar a assistência dos bancos em Caxias.
O povo falou primeiro
A audiência pública, que começou às 18h30m e também foi transmitida por meio eletrônico pelo sítio da Câmara e redes sociais, transcorreu inicialmente com a manifestação de participantes da plateia. O primeiro a falar foi o deficiente visual Fernando Nascimento de Melo, representando a Associação dos Deficientes Visuais de Caxias, expondo as muitas dificuldades que as pessoas com esse tipo de problema físico enfrentam nas agências bancárias. Depois falou o jovem Cássio, da Associação dos Surdos de Caxias, informando que sempre que necessita ir a um banco precisa da companhia de um voluntário para acompanhá-lo, lamentando a ausência de funcionários que ajudem na acessibilidade.
Outro que se expressou foi o empresário Adriano Moura, destacando que os bancos lucram muito para fazer um trabalho diferenciado, mas pouco oferecem aos seus usuários. Também o representante do Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (SINTRAF), Antonio José de Sousa, expôs as muitas dificuldades que o trabalhador rural de Caxias enfrenta hoje nos bancos da cidade, pois chegam muito cedo, passam o dia todo em filas e, às vezes, só no dia seguinte conseguem acessar seus benefícios.
A representante do Conselho Municipal do Idoso, Cinthya Valéria Araújo de Moura, enfatizou as dificuldades e o desrespeito com que são tratados os idosos, que mesmo respaldados por lei, não têm prioridade em nada. Ela apontou as situações que cobram prova de vida aos idosos e citou o caso de uma anciã que acabou falecendo diante da agência do Bradesco, após passar a manhã inteira sob o sol e sem almoçar.
Dentre outras pessoas, também se manifestaram Camila da Silva Braúna, do Conselho dos Deficientes de Caxias, e a policial civil Ely, que dirige também uma organização não governamental e é vice-presidente do Conselho Municipal do Idoso. A reclamação que destacaram mostrou o problema da venda de senhas, por moradores de rua e mendigos, para acesso às filas das agências bancárias, e que, mesmo com senha, o idoso tem de entrar na fila como qualquer outra pessoa mais nova.
O cidadão Vítor Augusto Salazar de Sousa denunciou que falta aos funcionários dos bancos conhecimento sobre a legislação municipal específica para o sistema bancário local; apontou também que não há organização de filas dentro das agências, nem funcionários que prestem informação, e pediu a abertura de mais agências da Caixa Econômica na cidade.
A palavra dos bancos
O gerente-geral do Banco do Nordeste em Caxias, Francisco de Assis Santos Silva, que está na cidade há cerca de dois meses, reconheceu que as dificuldades acontecem, mas revelou que tem sérios problemas a resolver internamente. Pontuou que a pandemia dificultou mais o atendimento em sua agência, porque em muitos momentos foi reduzido o quadro de funcionários.
Segundo ele, há o problema também da falta de funcionários, uma vez que o BNB local está funcionando com 12 servidores, quando deveria estar funcionando com 18. Destacou que a instituição oferece tratamento diferenciado para pessoas que precisam fazer prova de vida, inclusive indo até à casa de quem não possa vir, por qualquer motivo, à sua agência, e anunciou que fez solicitação para abertura de concurso público para preenchimento das vagas disponíveis no BNB de Caxias.
O gerente-geral do Bando do Brasil em Caxias, James do Val Lima, também há dois meses na cidade, considerou o encontro válido e importante, algo que engrandece a cidade, uma vez que, se o sistema bancário não funcionar a contento, em vez de favorecer desenvolvimento, só irá atrasar o município. Ele acrescentou que hoje o Banco do Brasil é o maior banco digital de Caxias e possuiu também o maio espaço físico, inclusive com acesso de elevador ao segundo piso da agência, e lamentou que a cultura do brasileiro seja muito ainda de ir presencialmente a uma agência bancária.
Na sua avaliação, muitas pessoas não compreendem que o atendimento na agência local funciona em três tipos de carteiras, que são as carteiras para o agronegócio, a pessoa jurídica e a pessoa física, assim também que o trabalho no banco é altamente regulamentado pelo Banco Central. Ele recomendou, inclusive, que a clientela faça reclamações diretamente à auditoria do banco, provocando-a a fazer mudanças no atendimento pré-estabelecido, uma vez que, no seu entendimento, o consumidor tem muitos direitos, e se prontificou a colaborar no que for possível para melhorar a prestação de serviços em Caxias.
Surpresa e perplexidade
Em pronunciamento aguardado sob muita expectativa, o promotor de justiça da 7ª Promotoria da Comarca de Caxias, José Carlos Faria Filho, manifestou surpresa e perplexidade diante do que ouviu dos oradores que o precederam, revelando que tinha ido à casa para discutir o direito do consumidor, quando, na verdade, o que assistiu tinha que ser repensado, pois tratava-se de fatos ligados ao direito da dignidade humana.
“Esses assuntos, essas denúncias, nunca chegaram ao Ministério Público, são situações que envolvem idosos, deficientes, e a providência que iremos tomar, já partir da próxima semana, é estabelecer uma agenda para ouvir pessoalmente cada uma dessas pessoas que hoje fizeram denúncias, a fim de possamos traçar metas que serão resolvidas dentro de prazo razoável”, informou.
Para o promotor José Carlos Faria Filho, é essencial que as pessoas tenham a quem recorrer. Ele salientou que o Município de Caxias tem diversas leis que resguardam o consumidor, inclusive com sansões expressas, mas não há quem as aplique. E recomendou que a Câmara Municipal provoque o Poder Executivo a cumpri-las, se for o caso, até estabelecendo na cidade um PROCON municipal para ajudar na solução desses e outros problemas relacionados aos direitos do consumidor.
O promotor recomendou a comunidade a procurar a 7ª Promotoria de Justiça de Caxias caso qualquer uma das situações denunciadas aconteça, assim será possível iniciar os corretos procedimentos e, primeiramente, conversações que favoreçam a solução dos casos.
Providências
A audiência pública reuniu nove vereadores no plenário da CMC (Teódulo Aragão, Torneirinho, Daniel Barros, Professor Chiquinho, Gentil Oliveira, Luís Lacerda, Darlan Almeida, Antonio Ramos e Ricardo Rodrigues), dezenas de convidados e representações de várias entidades de classe.
Em suas manifestações, os vereadores consideraram inadmissível o que está acontecendo nas agências bancárias de Caxias, onde é percebido que não há investimento que proporcione conforto e informação aos clientes. Não há interpretes de libras disponíveis para conversar com os surdos, nem acompanhantes para conduzirem deficientes visuais, sem falar na desorganização de filas e extrema falta de segurança, dentro e fora das agências, sobretudo nos períodos de fim de semana, facilitando o acesso de importunadores aos clientes.
Para parte da bancada de vereadores que compareceu à audiência, é inadmissível que os bancos brasileiros sigam com a política de contensão de despesas para aumentar seus lucros, que já são exorbitantes, na casa de dezenas de bilhões de reais, a cada ano ou semestre. O vereador Daniel Barros, autor do requerimento da audiência, foi muito elogiado pela iniciativa, assim como a própria Câmara Municipal, por estar proporcionando essas oportunidades de discussão dos graves problemas de Caxias.
Ao final da audiência, em suas considerações finais, o presidente Teódulo Aragão, anunciou que a casa irá ajudar a 7ª Promotoria de Justiça de Caxias a colher denúncias que estejam afetando os consumidores de Caxias. Ele adiantou que na próxima semana será montado um ponto de atendimento nas dependências da CMC, local que as pessoas poderão utilizar para oferecer denúncias ao corpo jurídico da casa, para imediato encaminhamento ao Ministério Público.